quarta-feira, 12 de dezembro de 2018


Poços de Caldas: um sonho realizado

Minha família materna é toda de Minas Gerais. Durante as férias, viajávamos para a cidade natal da minha mãe e passávamos alguns dias com minha vó. Na casa dela havia um grande e detalhado mapa do estado. Lembro de passar horas olhando para ele, calculando as distâncias entre as cidades. Naquela época, eu com uns oito anos, ficava me perguntando se Poços de Caldas seria a capital nacional de doces enlatados...

Logo descobri que o nome da cidade tinha relação com suas fontes de água sulfurosa. Ficou na minha cabeça com o passar dos anos. Sempre que viajava para a cidade da família, pensava se algum dia teríamos tempo – e dinheiro – para visitar Poços de Caldas. Era meio que um sonho dormente, só despertava quando eu lembrava que a cidade existia – e que talvez nunca pudesse conhecê-la.

O tempo passou e, quando redirecionei meu roteiro de viagem para Minas Gerais, o sonho acordou novamente. Enfim chegara o momento propício. E, num sábado ensolarado, lá estava eu na rodoviária de Poços, esperando o ônibus que me deixaria no centro da cidade. O sonho se realizava.

Calendário floral

Sem dúvidas, minha passagem por Minas Gerais rendeu as experiências mais intensas e valiosas de toda a viagem. Talvez pelo fato daquilo não ser mais para a criação dos livros, e sim como um desejo espontâneo de uma viajante solitária. Ou ainda, quem sabe, porque me sentia mais perto de casa, da família.

Parti para Poços quando deixei a capital de São Paulo. Cerca de quatro horas de viagem de ônibus. Assim que aportei na rodoviária fui saudada pelo sol forte, tão bem-vindo, de Minas Gerais. Peguei o coletivo urbano e rumei para o centro onde me hospedei num hostel. Infelizmente, o orçamento apertado me limitou a apenas duas noites. Teria ficado uma semana se tivesse encontrado um anfitrião do Couchsurfing.

A cidade é fenomenal! Ok, minha opinião é tendenciosa pois passei pouco tempo e circulei principalmente pelas áreas turísticas. Mas, gente, Poços de Caldas tem encantos particulares.

Foi com prazer melancólico de garota de cidade grande que assisti as atividades que ocorrem na Praça Pedro Sanches. É um ponto central da cidade que reúne muitos visitantes, seja para caminhar, brincar com as crianças, fazer um lanche nas barracas de rua, ouvir música ao vivo, dançar uns xotes ou até fazer um ato politico – houve uma manifestação EleNão na noite de sábado, estávamos às vésperas da eleição.

Senti em Poços a energia calorosa de uma comunidade pequena e receptiva. Ver os casais dançando alegremente na praça me dava vontade de chorar.


Meu emocional estava bem mexido com a saudade de casa e o subsequente receio de encerrar a viagem. Ironicamente, quanto mais me aproximava do destino final, mais nervosa ficava.

Bem, estava no lugar certo para dar uma apaziguada na alma. Poços de Caldas é um destino terapêutico, tanto que os tratamentos com a água sulfurosa são seu principal chamariz turístico. Estive nas Thermas de Antônio Carlos para conhecer os serviços disponíveis. O mais simples era um banho de submersão. Custava uns 30 reais. Pensei em fazer, mas depois, repensei: “Pagar 30 reais pra tomar banho?”. Preferi gastar com comida.

Thermas Antonio Carlos

À noite, tomei um açaí em uma das muitas – muitas mesmo! - açaímanias dos arredores do Centro. Aproveitei ainda para admirar o visual noturno da Praça Pedro Sanches.

Praça Pedro Sanches

No domingo, levantei cedo com a intenção de fazer a trilha do Cristo Redentor. Poços de Caldas também tem o seu! Existe a opção de subir de teleférico, mas eu queria a versão hard da experiência. Como também há a possibilidade de ir de carro, me indicaram subir pelo asfalto e descer pela trilha, assim diminuiriam as chances de me perder. Foi o que fiz.

Para narrar o que sucedeu, passo a palavra para a trilheira inexperiente e arquejante que tomou posse do meu corpo no passado:


Levei a exata uma hora de caminhada para chegar ao Cristo. Tirei uma foto dele e respirei fundo. Quase relaxei. Então lembrei que tinha que descer pela trilha de 908 metros para voltar a cidade...

Cristo
Trilha do Cristo

Hoje, consigo rir da situação, mas aquele dia eu sinceramente pensei em deitar na grama e esperar a morte. NÃO AGUENTAVA MAIS ANDAR!

Vista da cidade

Mais uma longa hora depois, com os joelhos moles devido ao esforço, cheguei no hostel faminta, suada, descabelada e molhada, porque o tempo teve a audácia de fechar e chover. Acima de tudo, estava super orgulhosa de mim mesma por não ter sucumbido ao cansaço.

Essa é a prova concreta do quão louca posso ser.

Depois de um banho e o tão aguardado almoço, voltei para a rua. Não havia tempo a perder, partiria no dia seguinte.

Segui um roteiro indicado na internet e acabei parando na Fonte do Monjolinho. Já havia visto outras fontes como aquela em outros pontos da cidade, inclusive durante a subida ao Cristo. Só naquele momento me dei conta que a água disponível ali era própria para o consumo, além de ser gratuita. Vários moradores estavam enchendo seus galões.

Fonte do Monjolinho

Enchi minha garrafinha – da qual não desgrudava mais –, e fiz o trajeto inverso para voltar ao meu ponto de partida: a Praça dos Macacos. Nesta praça, há outra fonte, porém com a famosa água sulfurosa.

A água brota quente, quase fervendo, e tem cheiro de ovo cozido. Deixa uma sensação oleosa na pele. Fascinante. Várias pessoas a utilizam como remédio para o corpo e a pele. Conversei com uma moça, turista, que jurava que cinco minutos com os pés naquela água haviam diminuído os efeitos da sua tendinite. Fiquei olhando enquanto ela monopolizava a fonte para lavar os pés.

Foi mágico de formas que não consigo descrever. Queria ter minha família ali para mostrar a minha descoberta. Dizer: “Olha só, estou tocando em água sulfurosa! Venham ver como é gostoso”.

Naquele dia, e ainda hoje, penso em quantas pessoas nunca saberão como é a sensação... Ver, tocar e sentir um sonho nas palmas das suas mãos. Realizar algo da qual você se orgulhe muito.

Estar em Poços de Caldas me permitiu tomar consciência do que havia acontecido com a minha vida. Do que eu fiz acontecer. No correr do dia a dia, a gente pode esquecer de avaliar nossas conquistas, mesmo que sejam coisas explícitas como uma longa viagem.

A noite, na Praça Pedro Sanches, sentada num banco diante de uma fonte musical, chorei como um bebê por tudo o que tive o prazer de viver.
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