sexta-feira, 23 de agosto de 2019


Memórias de Viagem: aquela companhia...

Aprendi na prática que viajar sozinha não significa estar sozinha. Seja fisicamente, virtualmente, ou mesmo espiritualmente, sempre estive acompanhada. Reservo esse espaço para apresentar a galera que fez da minha experiência como mochileira verdadeiramente incrível.

Quem acompanha o blog deve ter percebido que não sou de postar fotos de pessoas – e até minhas. Hoje abro uma exceção.

Com vocês:


Na quarta-feira do dia 08/08/2018 cheguei na casa da minha primeira anfitriã, que havia conhecido pelo Couchsurfing. Também era a primeira vez que ela hospedava um viajante. Lembro que sua mãe estava no apartamento quando entrei. Fiquei muito desconfortável diante das duas porque sabia que procuravam algum indício de periculosidade em mim. Elas me bombardearam de perguntas que me deixaram ainda mais tensa. Na hora, o receio bateu com força. Pensei em desistir da ideia de anfitriões e procurar um hotel. A desconfiança entre nós não permitiria que relaxássemos.

Tudo mudou no segundo em que a anfitriã me entregou uma cópia da chave da casa. Fiquei surpresa com o nível de confiança que ela literalmente colocou em minhas mãos. Então percebi que, se ela estava disposta a correr riscos, eu podia fazer o mesmo. Respirei fundo e abaixei as defesas. A decisão certa a se tomar, pois a anfitriã era uma pessoa legal. No mesmo dia, me levou para conhecer o centro de Porto Alegre, tomar sundae no Mercado Público e andar pela UFRGS. Ela não só me preparou para o Rio Grande do Sul, como também moldou minha imagem de anfitrião.

Foi um prazer tê-la conhecido.


Acabei fazendo vários contatos pelo Couchsurfing em Porto Alegre. Um em especial me levou a um casal muito querido. Numa noite pra lá de chuvosa, eles me convidaram para comer um xis na Cidade Baixa. Hesitei antes de aceitar – o frio era congelante. Só que a curiosidade para saber o que era um xis foi maior. Umas sete horas da noite, lá ia eu de guarda-chuva pelas ruas de PoA. E valeu a pena!


O encontro rendeu uma continuação que aconteceu no dia seguinte. A moça me levou para andar pela cidade. Andar mesmo. Caminhamos por horas. Passamos por museus, igrejas, parques até chegar na Orla do Guaíba. Depois voltamos tudo de novo. Infelizmente, não pude encontrá-los mais uma vez. Mas o contato continua salvo no celular.


O segundo lugar em que recebi guarita em Porto Alegre foi citado nas duas postagens anteriores. Tenho muita vontade de receber viajantes na minha casa só para ver se consigo ser uma anfitriã tão incrível quanto esse casal maravilhoso.


Eles me receberam com uma tranquilidade desarmante. Não mediram esforços para me fazer sentir confortável e ajudar na minha pesquisa. Foram passeios para pontos turísticos, lições sobre chimarrão e culinária gaúcha, longas conversas sobre sua cultura e, inclusive, conseguiram marcar uma entrevista com um professor de história para mim. Até hoje fico sem palavras para agradecer essas duas pessoas.


Fiz uma parada em Novo Hamburgo que rendeu duas companhias especiais. A anfitriã, que foi me buscar pessoalmente na estação de trem, e o Cascão, que dormia comigo a noite.


Sobre a anfitriã, foi especialmente interessante conhecê-la. Se tratava de uma catarinense – ou paranaense... puxa, esqueci! – que morava no RS há alguns anos. A visão dela sobre a cultura gaúcha era diferente, assim como seu sotaque. Conversamos demais. Na noite anterior a nossa despedida, ela me levou até a cobertura do seu prédio e me mostrou o porquê de gostar daquele pacato distrito. O silêncio nesses lugares é diferente, sabe? E foi a primeira vez que percebi isso.

Obrigada por ter compartilhado essa descoberta comigo.


Na parada seguinte, em Bento Gonçalves, eu vivi a situação mais extrema que um surfing poderia encontrar. Sério, quando conto para as pessoas elas duvidam da veracidade dos fatos. Realmente parece loucura alguém entregar a própria casa para um estranho e ir dormir em outro lugar. Mas aconteceu! Comigo!!

Por um erro no cronograma, precisei solicitar um anfitrião às pressas no Couchsurfing. Um rapaz atendeu meu pedido. Até aquele momento, eu dava preferência por ficar com mulheres, mas, como a outra opção era dormir na rua, lá fui eu para a casa dele. Era um apartamento de um quarto só. Logo, me resignei a dormir no chão, porém, contra todas as expectativas, o anfitrião não só me ofereceu a cama, como também avisou que passaria a noite na casa de um amigo. Resumo: ele me deu a chave da porta e foi embora.

Fiquei admirada com a atitude. Uma coisa que parecia impensável, mas que, na hora, foi tão natural da parte dele que me levou a questionar: por que não? Se você tem algo a oferecer, por menor que seja, por que não oferecer? Pode fazer uma diferença enorme na vida de alguém. Para mim fez. Não só tive uma cama para me deitar, como vi todos os pensamentos do tipo “a humanidade está perdida” serem varridos da minha mente. Tem muita gente boa espalhada nesse mundo.

E essa aqui é uma das melhores!


Tive um segundo anfitrião em Bento. Dessa vez, um casal que trabalhava o dia inteiro e não tinha tempo para sair comigo. Acabei não tirando foto de nenhum deles, mas a estádia continuou sendo significativa. Uma noite, após ouvir o quanto eu queria experimentar um fondue típico da Serra Gaúcha, a anfitriã simplesmente preparou o fondue para mim. Com direito a vinho e luz de velas. Os dois estavam acostumados a receber viajantes, mas achei o gesto tão bonito que fiquei constrangida. Sabe quando alguém faz algo tão legal, mas tão legal, que você fica desnorteado? Era eu aquela noite.

Durante nossas conversas, contei a eles como foram minhas tentativas de tomar chimarrão. Dias depois a anfitriã me enviou essa imagem dos Dez Mandamentos do Chimarrão, dizendo que havia lembrado de mim. Desde então uso as regras como uma bússola para evitar gafes.


Nos dias em que estive em Cotiporã, Veranópolis e Caxias do Sul, fiquei em hotéis por falta de anfitriões. Nesse período, acabei me sentindo deprimida e isolada, até considerava desistir da viagem. Assunto para outro post. O que importa é que foi nessa fase chata que conheci o Marcos – vou pôr o nome dele, porque é praticamente uma figura pública.

Marcos era um mochileiro calejado. Passou anos pedalando por inúmeros países. Se tinha alguém que entendia o que eu estava passando, esse alguém era ele. Nos falávamos há semanas quando pedi para que me buscasse em Caxias do Sul. Tudo que eu queria era voltar a ter alguém com quem contar, um anfitrião. E ele apareceu. Nas três semanas seguintes fui sua colega de quarto, aprendiz e companheira de viagem. Juntos, desbravamos a Serra Gaúcha. Andamos por Flores da Cunha, Nova Pádua, Antônio Prado, Picada Café, Gramado e Canela. Fizemos trilhas, visitamos pontos turísticos e pegamos chuva suficiente para ter pneumonia. E quando não havia nada mais hardcore para fazer, ficávamos em casa vendo filmes e devorando biscoitos coloniais. Grandes dias!


Mas não posso falar do Mirante Gelain sem lembrar dos seus outros habitantes: os cachorros Lara e Costela, e a calopsita Filó. Estavam sempre por perto, dando ainda mais familiaridade ao lugar.


E outra figura recorrente por lá era a Jaque, namorada do Marcos. Conversando com ela aprendi muito sobre o interiorzão gaúcho, a vida dos descendentes italianos e a vinicultura. Só o seu sotaque colonial já era uma aula aos meus ouvidos.


Da Serra Gaúcha viajei direto para São Paulo capital. Lá, quem me esperava era uma amiga que havia conhecido pela internet meses antes. Ela acompanhou todo meu percurso em tempo real. Eu compartilhava com ela as fotos, as descobertas, os aprendizados, os medos; mas, no dia em que nos veríamos cara a cara, fiquei nervosa demais. Morria de medo de não conseguir estabelecer a mesma conexão que tínhamos online. Um receio que caiu por terra quando nos encontramos.


Em sua casa, conheci sua mãe, que é a senhora mais doce que apareceu na minha vida. Até ela já havia falado comigo pelo zap, mas ao vivo foi muito mais divertido. As duas formavam uma ótima dupla e adorei fazer parte da família por alguns dias.


E ainda teve a irmã da minha amiga, que foi responsável por me apresentar a cidade. Ela me levou de metro até o bairro da Liberdade, me indicou bebidas exóticas e acompanhou enquanto eu me fascinava pela cidade grande.


E a última grande companhia que tive durante a viagem foi a minha família. Depois de andar por terras estranhas, me habituar ao desconhecido, nada melhor que uma dose de casa. Não preciso dizer nada...


Aproveito para homenagear as companheiras de estrada que nunca me decepcionaram. Amo vocês, lindas!


Quero agradecer a todos que marcaram presença nessa aventura. Palavras não são grande coisa perto do que me ofereceram, mas não faz mal dizê-las. Então obrigada. Talvez não saibam como foram importantes nessa trajetória. Jamais irei esquecê-los.

Até a próxima!



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